POR QUE A FÉ É ESCOLHIDA como o canal da salvação? Sem dúvida, esta pergunta é feita com frequência. "Pela graça sois salvos, por meio da fé" é certamente a doutrina da Sagrada Escritura e a ordenança de Deus; mas por que é assim? Por que a fé é escolhida em vez da esperança, do amor ou da paciência?
Convém-nos ser modestos ao responder a tal pergunta, pois os caminhos de Deus nem sempre são compreendidos; nem nos é permitido questioná-los presunçosamente. Humildemente, responderíamos que, até onde sabemos, a fé foi selecionada como o canal da graça, porque há uma adaptação natural na fé para ser usada como receptora. Suponha que eu esteja prestes a dar uma esmola a um pobre: eu a coloco em sua mão — por quê? Bem, dificilmente seria apropriado colocá-la em seu ouvido ou colocá-la em seu pé; a mão parece feita de propósito para receber. Assim, em nossa estrutura mental, a fé é criada de propósito para ser receptora: é a mão do homem, e há uma adequação em receber graça por meio dela.
Deixe-me explicar isso de forma bem clara. A fé que acolhe a Cristo é um ato tão simples quanto quando seu filho recebe uma maçã sua, porque você a estende e promete dar a ele a maçã se ele vier buscá-la.
A crença e o recebimento referem-se apenas a uma maçã; mas constituem precisamente o mesmo ato que a fé que trata da salvação eterna. O que a mão da criança é para a maçã, a sua fé é para a perfeita salvação de Cristo. A mão da criança não faz a maçã, nem a melhora, nem a merece; ela apenas a toma; e a fé é escolhida por Deus para ser a receptora da salvação, porque não pretende criá-la, nem ajudá-la, mas se contenta humildemente em recebê-la. "A fé é a língua que implora perdão, a mão que o recebe e o olho que o vê; mas não é o preço que a compra." A fé nunca se torna seu próprio argumento; ela baseia todo o seu argumento no sangue de Cristo. Ela se torna uma boa serva para trazer as riquezas do Senhor Jesus à alma, porque reconhece de onde as tirou e reconhece que somente a graça as confiou a ela.
A fé, novamente, é sem dúvida selecionada porque dá toda a glória a Deus. É pela fé para que seja pela graça, e é pela graça para que não haja vanglória; pois Deus não suporta o orgulho. "Ele conhece de longe os soberbos", e Ele não deseja se aproximar deles. Ele não dará a salvação de uma forma que sugira ou fomente o orgulho. Paulo diz: "Não vem das obras, para que ninguém se glorie". Ora, a fé exclui toda vanglória. A mão que recebe a caridade não diz: "Devo ser agradecido por aceitar o presente"; isso seria absurdo. Quando a mão leva o pão à boca, não diz ao corpo: "Agradece-me, pois eu te alimento". É algo muito simples que a mão faça, embora seja algo muito necessário; e ela nunca se apropria da glória pelo que faz. Assim, Deus escolheu a fé para receber o dom indizível da Sua graça, porque ela não pode atribuir a si mesma nenhum crédito, mas deve adorar o Deus gracioso que é o doador de todo o bem. A fé coloca a coroa na cabeça certa, e por isso o Senhor Jesus costumava colocar a coroa na cabeça da fé, dizendo: "A tua fé te salvou; vai em paz".
Em seguida, Deus escolhe a fé como canal de salvação porque é um método seguro que liga o homem a Deus. Quando o homem confia em Deus, há um ponto de união entre eles, e essa união garante a bênção.
A fé nos salva porque nos faz apegar a Deus e, assim, nos conecta com Ele. Tenho usado frequentemente a seguinte ilustração, mas preciso repeti-la, pois não consigo pensar em uma melhor. Contaram-me que, anos atrás, um barco virou sobre as cataratas do Niágara, e dois homens estavam sendo carregados pela correnteza, quando pessoas na praia conseguiram lançar uma corda até eles, corda que foi agarrada por ambos. Um deles segurou firme e foi puxado em segurança para a margem; mas o outro, vendo um grande tronco flutuando, imprudentemente soltou a corda e agarrou-se ao tronco, pois era o maior dos dois e, aparentemente, o melhor para se agarrar. Ai! O tronco com o homem sobre ele caiu direto no vasto abismo, porque não havia união entre o tronco e a margem. O tamanho do tronco não era benéfico para quem o agarrava; precisava de uma conexão com a margem para gerar segurança. Assim, quando um homem confia em suas obras, ou nos sacramentos, ou em qualquer coisa desse tipo, não será salvo, porque não há ligação entre ele e Cristo; mas a fé, embora pareça uma corda tênue, está nas mãos do grande Deus na praia; um poder infinito puxa a linha de conexão e, assim, salva o homem da destruição. Ó bem-aventurança da fé, porque ela nos une a Deus!
A fé é escolhida novamente, porque toca as fontes da ação. Mesmo nas coisas comuns, a fé de um certo tipo está na raiz de tudo. Eu me pergunto se estarei errado se disser que nunca fazemos nada exceto por meio de algum tipo de fé. Se atravesso meu escritório, é porque acredito que minhas pernas me carregarão. Um homem come porque acredita na necessidade de comida; ele vai aos negócios porque acredita no valor do dinheiro; ele aceita um cheque porque acredita que o banco o honrará. Colombo descobriu a América porque acreditava que havia outro continente além do oceano; e os Pais Peregrinos a colonizaram porque acreditavam que Deus estaria com eles naquelas costas rochosas. A maioria dos grandes feitos nasceu da fé; para o bem ou para o mal, a fé opera maravilhas pelo homem em quem ela habita. A fé em sua forma natural é uma força onipresente, que entra em todos os tipos de ações humanas. Possivelmente, aquele que ridiculariza a fé em Deus é o homem que, em uma forma maligna, tem mais fé; De fato, ele geralmente cai numa credulidade que seria ridícula, se não fosse vergonhosa. Deus dá salvação à fé, porque, ao criar a fé em nós, Ele toca a verdadeira mola mestra de nossas emoções e ações. Ele, por assim dizer, tomou posse da bateria e agora pode enviar a corrente sagrada a cada parte de nossa natureza. Quando cremos em Cristo, e o coração passa a ser possuído por Deus, então somos salvos do pecado e movidos ao arrependimento, à santidade, ao zelo, à oração, à consagração e a todas as outras coisas graciosas. "O que o óleo é para as rodas, o que os pesos são para um relógio, o que as asas são para um pássaro, o que as velas são para um navio, essa fé é para todos os deveres e serviços sagrados." Tenha fé, e todas as outras graças seguirão e continuarão a manter seu curso.
A fé, por sua vez, tem o poder de operar pelo amor; ela influencia as afeições por Deus e atrai o coração para as melhores coisas. Aquele que crê em Deus, sem sombra de dúvida, amará a Deus. A fé é um ato do entendimento; mas também procede do coração. "Com o coração se crê para a justiça"; e, portanto, Deus concede salvação à fé porque ela reside ao lado das afeições e é intimamente relacionada ao amor; e o amor é o pai e o nutridor de todo sentimento e ato santo. Amar a Deus é obediência, amar a Deus é santidade. Amar a Deus e amar o homem é ser conformado à imagem de Cristo; e isso é salvação.
Além disso, a fé cria paz e alegria; aquele que a possui descansa e está tranquilo, é alegre e jubiloso, e isso é uma preparação para o céu. Deus concede todos os dons celestiais à fé, por esta razão, entre outras, que a fé opera em nós a vida e o espírito que se manifestarão eternamente no mundo superior e melhor. A fé nos fornece armadura para esta vida e educação para a vida futura. Ela capacita o homem a viver e a morrer sem medo; prepara tanto para a ação quanto para o sofrimento; e, portanto, o Senhor a seleciona como o meio mais conveniente para nos transmitir graça e, assim, garantir-nos a glória.
Certamente a fé faz por nós o que nada mais pode fazer; ela nos dá alegria e paz, e nos faz entrar em descanso. Por que os homens tentam obter a salvação por outros meios? Um velho pregador diz: "Um servo tolo, a quem se ordena abrir uma porta, empurra com o ombro e a empurra com toda a força; mas a porta não se move, e ele não consegue entrar, por mais força que tenha. Outro vem com uma chave, destranca a porta facilmente e entra prontamente. Aqueles que desejam ser salvos pelas obras estão empurrando a porta do céu sem resultado; mas a fé é a chave que abre a porta imediatamente." Leitor, você não usará essa chave? O Senhor ordena que você creia em Seu Filho amado, portanto, você pode fazê-lo; e fazendo isso você viverá. Não é esta a promessa do evangelho: "Quem crer e for batizado será salvo"? (Marcos 16:16). Qual pode ser a sua objeção a um caminho de salvação que se recomenda à misericórdia e à sabedoria do nosso Deus gracioso?
